terça-feira, 8 de maio de 2012

C'est La Vie ...

Arthur Dapieve - É manhã. Vocês estão com a cabeça descansada. Pensei em tratar do tema morte, da ideia de finitude, da experiência da passagem do tempo. Vocês provavelmente leram "O Outono do Patriarca", do García Márquez. Ao final do livro, o ditador de algo entre 107 e 232 anos reflete que mesmo as vidas mais longas e produtivas não servem para nada além de aprender a viver. Vocês acham que é isso? Ou aprende-se alguma outra coisa com a vida? Uma vida longa e produtiva como a de vocês

Zuenir Ventura (risos) - Luis Fernando, pergunta difícil é para você.

Luís Fernando Veríssimo - A lição maior, à qual eu acho que a gente resiste, é ver o absurdo da vida. Tudo isto pra quê? Pra nada, né. Agora, tudo isso tem seu valor. Mas, como lição de chegar a uma filosofia no fim da vida sobre a vida, eu acho que não seve para muita coisa, não. Sei que é uma atitude meio niilista, mas é o que eu acho. A morte é o fim de tudo, não fica nem memória, pra gente não fica memória, não tem outra vida, não tem nenhuma consequência de ter vivido de um jeito ou de outro. Então, eu acho que  a lição da vida é o absurdo da vida. Mas é uma lição à qual a gente deve resistir, não se deve sucumbir a ela. Acho que é o Camus que diz que a única questão filosófica séria é o suicídio. Quer dizer, o suicídio é quando você se dá conta do absurdo de tudo. Então, a gente deve resistir a este "se dar conta do absurdo da vida" E viver como se a vida tivesse sentido, e você eventualmente vai levar um tipo de sabedoria, um tipo de consequência, um tipo de recompensa, vamos dizer assim.

Zuenir Ventura - O próprio suicida, o próprio Camus tem a metáfora do Sísifo.

Luis Fernando Verissimo - É. A vida está sempre levando a pedra até lá em cima, e a pedra volta rolando.

Arthur Dapieve - Ele fala do absurdo e do suicídio o tempo todo. Mas no final vem um golpe, porque ele escreve: "É preciso imaginar Sísifo feliz." É a última frase do livro. Uma solução Deus ex machina para a vida, ele decide.

Luis Fernando Verissimo - Exatamente.

Zuenir Ventura - Eu acho que é exatamente o que o Luis Fernando disse. Agora, engraçado, essa coisa não me angustia como eu acho que o angustia. Quer dizer, a gente pensa muito na finalidade, na vida como um fim. Eu acho que a gente esquece que o importante é o caminho, o meio. O que mais me preocupa, preocupa não, o que me interessa é realmente esse caminho. Eu não me coloco "o que vai ser depois", "o que será da minha vida?" Porque eu acho que o que irrompe no aqui e agora é que é realmente fundamental. Eu disse que a minha grande angústia é o sofrimento, não a morte. Agora, a morte, como disse seu amigo ...

Arthur Dapieve - ... a morte não existe pra gente.

Zuenir Ventura - ... não existe pra gente. Como eu não acredito no além, nessas coisas ... Seria terrível, você do outro lado olhando o que você perdeu. Olhando pra cá e dizendo:"pô, tô perdendo esta festa, tô saindo no meio da festa."

Arthur Dapieve -  Ao menos temporariamente. Por que se você fosse pra lá, os outros também iriam pra lá. E aí, de repente.

Zuenir Ventura - Não me aflige essa coisa do sentido da vida, esse enigma que a gente não consegue decifrar, que é o absurdo. Que é realmente o absurdo. Mas eu acho que o Camus acaba resolvendo dessa maneira poética, linda, de que ao mesmo tempo é preciso imaginar o Sísifo feliz - quer dizer, carregando pedras, sem sentido, aquela coisa. Enfim, não é uma questão existencial, metafísica, pra mim não. não mesmo.

Luis Fernando Verissimo - Eu acho que no fundo ninguém acredita completamente que vai morrer, que vai desaparecer.

Arthur Dapieve - É algo inconcebível.

(...)

Luis Fernando Verissimo e Zuenir Ventura
Conversa sobre o tempo
com Arthur Dapieve




Nenhum comentário:

Postar um comentário