sábado, 21 de julho de 2012

"Rebeldia nostálgica não ... "



Titãs
Data - 21 de julho
Horário - 21:30 (abertura da casa)
Local - Curitiba Master Hall

Guia Curitiba Apresenta
Fundação Cultural de Curitiba
Texto - Karen Monteiro
Colaboração - Edson Liberato

"Rebeldia nostálgica não ..."

Resposta bem-humorada do guitarrista dos Titãs, Tony Belotto, ao Guia Curitiba Apresenta, sobre o perfil do público no show comemorativo do disco "Cabeça Dinossauro", que a banda tem feito pelo Brasil e que acontece em Curitiba no dia 21 de julho, às 21:30, no Curitiba Master Hall. "Temos feito o show 'Cabeça Dinossauro' e tem sido glorioso. Nosso público sempre foi muito crítico e questionador. Os públicos daquela época e o atual são muito parecidos. Talvez o atual esteja um pouco mais grisalho, mas como já não enxergo muito bem, pode ser só uma impressão".

Um pouco antes do estrondoso sucesso da banda, que este ano completa 30 anos e que explodiu justamente com "Cabeça Dinossauro", em 1986, as preocupações dos integrantes eram as mesmas dos músicos das bandas que ainda não tinham decolado. Nando Reis já com dois filhos, no inicio da formação, ainda durante a ditadura, se perguntava se não seria melhor tocar numa banda de baile, sem imaginar que o disco, até hoje apontado como um dos mais importantes da história do rock brasileiro, alçaria os Titãs aos palcos mais importantes do país.

"Na época em que foi lançado, havia a cena de uma juventude buscando liberdade, buscando se expressar, o que ficava difícil até 1984. É bom lembrar que até 1988 ainda existia censura. A música 'Bichos Escrotos' tinha palavrão no meio, tinha o piii para esconder a palavra ...", lembra Edson Liberato Dias, professor universitário, comentarista de rádio e historiador apaixonado por música. Edson é da geração que saiu da infância e entrou na adolescência vendo o rock nacional tomar conta dos espaços musicais do país. "Vi surgirem alguns dos discos mais importantes da história nacional do rock. Foi um boom. Naquela época da euforia de consumo do Plano Cruzado vendia-se muito disco. Faltava vinil no mercado para a produção", lembra Edson.

"Cabeça Dinossauro" foi um disco gravado depois de um período nebuloso da carreira, quando Arnaldo Antunes e Tony Belotto tinham sido presos por porte de drogas, o que ocasionou, além de shows cancelados, "desilusão generalizada e um tremendo baixo-astral", segundo Tony Belotto. Num texto escrito para blog, o compositor que se tornaria escritor, continua: "o disco nasceu dessa raiva, mas também de um aprimoramento estético, em que já estávamos trabalhando havia algum tempo, produzindo canções com letras diretas e objetivas ...".

Com o disco, a postura da banda acabou sendo mais fácil de identificar. O lado agressivo, o rok pesado, continuaria a ser explorado com "Jesus não tem Dentes no País dos Banguelas" (1987). No lançamento do disco para a imprensa, o texto que circulou levava uma assinatura especial: a do poeta Paulo Lemniski, na época grande admirador da banda. A poesia concreta aproximaria o paranaense do sempre Titã (apesar da consolidada carreira solo) Arnaldo Antunes. O poeta deixou sua marca em canções como "Família", "Polícia", "Homem Primata", "Igreja" e outras do "Cabeça Dinossauro", influenciadas principalmente pelo punk rock, mas com pitadas de reggae e funk, que se tornaram hinos da rebeldia e da indignação de toda uma geração e que agora voltam à cena. E isso não é nostalgia, garantem os Titãs nas entrevistas pelo Brasil afora. Tudo, afirmam, continua muito atual e ainda diz respeito a todos nós.

domingo, 15 de julho de 2012

"Todo Repúdio"

O texto de abertura do livro "PunK: anarquia planetária e a cena brasileira" de Silvio Essinger, é o colocado abaixo:

Todo Repúdio


Ao Sistema injusto, à fome, à miséria, à falsidade, à mediocridade, à falta de humor, à exploração do homem pelo homem, aos que matam crianças, aos neonazistas e fascistas em geral, à hipocrisia, aos burocratas, à dança da bundinha, aos que exploram as desgraças do povo na TV, à Lei de Gerson, aos que vendem o Brasil, aos cheios de si, aos que batem em mulheres, aos que escravizam pela droga, aos maus patrões, aos monopólios, aos que deixam perpetuar a ignorância, aos fomentadores de intriga, à programação dominical de TV, aos que furam fila, à ganância, ao Star System, aos que vivem reclamando da vida e não fazem nada para mudá-la.

sábado, 14 de julho de 2012

Punks

Programa sobre os Punks na Transamérica Light (95,1), no programa Light News.
Eu, Maria Rafart, Deborah Fertonani e Clóvis Gruner.

Parte I - dia 25/06/2012
http://twitcam.livestream.com/anezc 

Parte II - dia  09/07/2012
http://twitcam.livestream.com/aw35j 




Manifesto Punk
Escrito por Clemente, vocalista e guitarrista do Inocentes.
Publicado em agosto de 1982, na revista "Gallery Around".

Nós, os punks, estamos movimentando a periferia - que foi traída e esquecida pelo estrelismo dos astros da MPB. Movimentando a periferia, mas não como Sandra Sá, que agora faz sucesso com uma canção racista e com uma outra que apenas convida o pessoal para dançar: ou, na verdade, o convida para a alienação. Nos nossos shows de punk rock, todos dançam; dançam a dança da guerra, um hino de ódio e revolta da classe menos privilegiada. Já Guilherme Arantes diz que é feliz, mesmo havendo uma crise lá fora, porque não foi ele quem a fez;nós também não fizemos esta crise, mas somos suas principais vitimas, suas vitimas constantes - e ele não. Nossos astros da MPB estão cada vez mais velhos e cansados, e os novos astros que surgem apenas repetem tudo o que já foi feito, tornando a música popular uma música massificante e chata. Mesmo assim, eles ainda consegue fazer o povo chorar. Não sei como, cantando a miséria do jeito que eles a vêem, do alto, mas que não sentem na carne, como nós. E também choram de alegria, quando cantam o dinheiro que ganham. Nós, os punks, somos uma nova face da música popular brasileira, com nossa música não damos a ninguém uma ideia de falsa liberdade. Relatamos a verdade sem disfarces, não queremos enganar ninguém. Procuramos algo que a MPB já não tem mais e que ficou perdido nos antigos festivais da Record e que nunca mais poderá ser revivido por nenhuma produção da Rede Globo de Televisão. Nós estamos aqui para revolucionar a música popular brasileira, para dizer a verdade sem disfarces ( e não tomar bela a imunda realidade): para pintar de negro a asa branca, atrasar o trem das onze, pisar sobre as flores de Geraldo Vandré e fazer da Amélia uma mulher qualquer.

Essa é a primeira música do Inocentes que se torna mais conhecida.



quarta-feira, 11 de julho de 2012

A Casa de Astérion

Texto: Jorge Luis Borges

E a rainha deu à luz um filho que se chamou Astérion.
Apolodoro, Biblioteca, III, I.

Sei que me acusam de soberba, talvez de misantropia e talvez de loucura. Tais acusações (que eu castigarei no devido tempo) são irrisórias. É verdade que não saio de minha casa, mas também é verdade que suas portas (cujo número é infinito *o original diz catorze, mas sobram motivos para inferir que, na boca de Astérion, esse numeral equivale a infinitos) estão abertas dia e noite para os homens e também para os animais. Que entre quem quiser. Não encontrará aqui pompas de mulher nem o bizarro aparato dos palácios, mas sim a quietude e a solidão. Encontrará igualmente uma casa como não há outra na face da Terra. (Mentem os que afirmam que no Egito há uma parecida.) Até meus detratores admitem que não há um único móvel na casa. Outro caso ridículo é que eu, Astérion, sou um prisioneiro. Devo repetir que não ha nenhuma porta fechada, devo acrescentar que não há fechadura? Além do mais, certo entardecer fui para a rua; se voltei antes de escurecer, foi pelo medo que me infundiram os rostos da plebe, rostos desbotados e achatados, semelhantes à mão aberta. O sol já tinha se posto, mas o choro desvalido de um menino e as toscas lamúrias da multidão disseram que haviam me reconhecido. O povo rezava, fugia, prosternava-se; alguns se encarapitavam no estilóbato do templo dos Machados, outros juntavam pedras. Um deles, creio, escondeu-se no mar. Não em vão foi minha mãe rainha; não posso me confundir com o vulgo, embora minha modéstia deseje.
O fato é que sou único. Não me interessa o que um homem possa transmitir aos demais; como o filósofo, penso que nada é comunicável pela arte da escrita. As minúcias desagradáveis e banais não têm cabida em meu espírito, que está preparado para o grande; jamais retive a diferença entre uma letra e outra. Certa impaciência generosa não permitiu que eu aprendesse a ler. Às vezes lamento, porque as noites e os dias são compridos.
Claro que não faltam distrações. Feito o carneiro que vai investir, corro pelas galerias de pedra até rolar pelo chão, zonzo. Eu me agacho à sombra de uma cisterna ou na curva de um corredor e brinco de esconder. Há terraços de que me deixo cair, até me ensanguentar. A toda hora posso brincar de fingir que durmo, com os olhos fechados e a respiração forte. (Às vezes adormeço realmente, às vezes já mudou a cor do dia quando abro os olhos.) Mas de tantas brincadeiras a que prefiro é a do outro Astérion. Finjo que ele vem me visitar e que lhe mostro a casa. Com grande reverência digo-lhe: "Agora voltamos à encruzilhada anterior" ou "Agora desembocamos noutro pátio" ou "Bem dizia eu que você gostaria da canaleta" ou "Agora você vai ver uma cisterna que se encheu de areia" ou "Já vai ver como o porão se bifurca". Às vezes me engano e ficamos rindo com muito gosto.
Não imaginei apenas essas brincadeiras; também meditei sobre a casa. Todas as partes da casa se repetem muitas vezes; todo lugar é outro lugar. Não há uma cisterna, um pátio, um bebedouro, uma manjedoura; são catorze [são infinitos] as manjedouras, bebedouros, pátios, cisternas. A casa é do tamanho do mundo; ou melhor, é o mundo. Contudo, de tanto exaurir pátios com uma cisterna e poeirentas galerias de pedra cinza, cheguei à rua e vi o templo dos Machados e o mar. Isso não entendi, até que uma visão da noite me revelou que também são catorze [são infinitos] os mares e os templos. Tudo se repete muitas vezes, catorze vezes, mas há duas coisas no mundo que parecem existir uma única vez: em cima, o intrincado sol; embaixo, Astérion. Talvez eu tenha criado as estrelas e o sol e a casa enorme, mas já não me lembro.
A cada nove anos entram na casa nove homens para que eu os livre de todo mal. Ouço seus passos ou sua voz no fundo das galerias de pedra e corro alegremente a seu encontro. A cerimônia dura poucos minutos. Cai um depois do outro sem que eu ensanguente as mãos. Onde caem, ficam, e os cadáveres ajudam a diferenciar uma galeria das outras. Ignoro quem sejam, mas eu sei que um deles profetizou, na hora da morte, que um dia chegaria meu redentor. Desde aquele momento não sofro com a solidão, porque sei que meu redentor existe e no fim se levantará do pó. Se meu ouvido alcançasse todos os ruídos do mundo, eu perceberia seus passos. Oxalá me leve para um lugar com menos galerias e menos portas. Como será meu redentor?, pergunto-me. Será  um touro ou um homem? Será talvez um touro com rosto de homem? Ou será como eu? 
O sol da manhã reverberou na espada de bronze. Já não restava um só vestígio de sangue.
- Será que acreditarás, Ariadne? - disse Teseu. - O minotauro mal chegou a se defender.